Descrição
Neste trabalho, proponho uma análise da gravação tropicalista da canção “Não identificado” por Gal Costa (1969), enfocando o diálogo entre as palavras cantadas e o arranjo musical de Rogério Duprat. Paródia reverente das baladas de Roberto Carlos, a canção se apresenta como uma mensagem de amor platônico que viaja a bordo de um disco lançado simultaneamente como LP e óvni. Voando pelo céu idílico da seresta brasileira, esse objeto não identificado provoca a interpenetração dos âmbitos físico-objetivo e metafísico-subjetivo. Atento à ambiguidade de uma canção “não identificada”, Duprat dilui a fronteira entre arranjo e soundscape, recorrendo a sonoridades típicas de trilhas sonoras de filmes de ficção científica norte-americanos dos anos 1950. Essa viagem sonora, no entanto, vai além da paisagem habitada por alienígenas, simulando ao mesmo tempo um vôo psicodélico que sugere a fusão entre o self e o mundo, tal como experimentada no final dos anos 1960 pelos usuários de LSD. Com esta análise, procuro discutir a importância do arranjador e do arranjo na definição dos sentidos de uma canção fonografada, considerando, portanto, o poder simbólico da música e do som em um dado contexto histórico-cultural.