Descrição
O artigo reflete sobre certo ofício de narrador que tem sido desempenhado por artistas contemporâneos em relação à história do passado recente. Com base na série de vídeos Nine Drawings for Projections (1989-2003), de William Kentridge (Joanesburgo, 1955), sugere-se que essa atuação se realize através de aproximações com as práticas narrativas do autobiógrafo e do historiador. No trabalho de arte em questão, a primeira delas se manifesta por meio de dois personagens dos filmes, Soho Eckstein e Felix Teitlebaum, alter egos do artista, que testemunham ao espectador suas experiências no ambiente segregacionista sul-africano, de modo semelhante àquele da composição de uma literatura de testemunho. Já a segunda, exprime-se na maneira com que Kentridge sugere uma narrativa sobre a modificação do cenário político de seu país, a partir da alteração paulatina da paisagem na composição do trabalho. Trata-se de um enunciado de tom mais sóbrio e que se constrói com o apoio de documentações fotográficas. As duas práticas sugeridas convergem então, na dinâmica da série, e nesse encontro demonstram um novo modo do artista contemporâneo posicionar-se politicamente diante da história de conflitos políticos ocorridos no passado recente.